sábado, 2 de julho de 2011

Dilemas Morais

O comboio descontrolado
Um comboio vai atingir 5 pessoas que trabalham desprevenidas sobre a linha. Mas temos a chance de evitar a tragédia accionando uma alavanca que leva o comboio para outra linha, onde ele atingirá apenas uma pessoa. Você mudaria o trajeto, salvando as 5 e matando 1?
( ) Mudaria
( ) Não mudaria
Esse dilema moral foi apresentado a voluntários pelo filósofo e psicólogo evolutivo Joshua Greene, da Universidade Harvard. “É aceitável mudar o comboio e salvar 5 pessoas ao custo de uma? A maioria das pessoas diz que sim”, afirma Greene em um de seus artigos. De facto, numa pesquisa feita pela revista Time, 97% dos leitores salvariam os 5. Fazer isso significa agir conforme o utilitarismo – a doutrina criada pelo filósofo inglês John Stuart Mill, no século 19. Para ele, a moral está na consequência: a atitude mais correcta é a que resulta na maior felicidade para o máximo de pessoas. Mas há um problema. A ética de escolher o mal menor tem um lado perigoso – basta multiplicá-la por 1 milhão.  
Mataria 1 milhão de pessoas para salvar 5 milhões? 
Uma decisão assim sustentou regimes totalitários do século 20 que desgraçaram, em nome da maioria, uma minoria tão inocente quanto o homem sozinho no trilho. Além disso, o acto de matar 1 para salvar 5 é o oposto do espírito dos direitos humanos, segundo o qual cada vida tem um valor inestimável em si – e não nos cabe usar valores racionais ao lidar com esse tema.

O comboio descontrolado (2)
Imagine a mesma situação anterior: um comboio disparado irá atingir 5 trabalhadores desprevenidos nos trilhos. Agora, porém, há uma linha só. O comboio pode ser parado por algum objecto pesado atirado à sua frente. Um homem com uma mochila muito grande está ao lado da ferrovia. Se  empurrá-lo para a linha, o comboio vai parar, salvando as 5 pessoas, mas liquidando uma. 

Empurraria o homem da mochila para a linha?
( ) Empurraria
( ) Não empurraria
Avaliando pela lógica pura, esse dilema não tem diferença em relação ao anterior. Continua a ser uma questão de trocar 1 indivíduo por 5. Apesar disso, a maioria das pessoas (75% nos estudos de Joshua Greene, 60% no teste da Time) não empurraria o homem. A equipa de Greene descobriu que, enquanto usamos áreas cerebrais relacionadas à “alta cognição”, isto é, ao pensamento profundo, para resolver o dilema anterior, este aqui provoca reações emocionais, mesmo nos que empurrariam o homem para os trilhos. Uma versão mais bizarra desse dilema propõe uma catapulta para atirar o homem pesado nos trilhos – e, surpresa, a maioria das pessoas volta a querer matar 1 para salvar 5. Conclusão: estamos dispostos a matar com máquinas, mas não mataríamos com as mãos.
Para Greene, a diferença nas respostas aos dois dilemas pode ser explicada pela selecção natural. Durante milhares de anos da nossa evolução, os seres humanos que matavam outros friamente atraíam violência para si próprios: eram logo mortos pelo grupo, gerando menos descendentes. Já aqueles que conseguiam segurar-se conquistavam amigos e proteção, transmitindo seus genes para o futuro. Assim, ao longo dos milénios, criamos instintos sociais que nos refreiam na hora de matar alguém.
Acontece que, na maior parte do tempo da nossa evolução, vivemos em cavernas e com lanças na mão, e não operando máquinas, botões ou alavancas. Isso faz com que nossos instintos sociais não relacionem o acto de apertar um botão ou puxar uma alavanca com o de atirar alguém para a morte – é por esse motivo que, para Joshua Greene, tanta gente mudaria a alavanca na situação anterior, mas não executaria o homem neste segundo dilema. “Os instintos sociais reflectem o ambiente nos quais eles evoluíram, não o ambiente moderno”, afirma o cientista.
Ele dá outro exemplo. Achamos um absurdo não prestar socorro a alguém que sofreu um acidente na estrada, mas esquece-mo-nos rapidinho que milhares de pessoas morrem de fome na África. Para Greene, o motivo dessa disparidade também está nos instintos. “Nossos ancestrais não evoluíram num ambiente em que poderiam salvar vidas do outro lado do mundo. Da forma como nosso cérebro é construído, pessoas próximas activam o  nosso botão emocional, enquanto as distantes desaparecem na mente.”
Para Greene, a diferença de atitudes mostra que os filósofos que lidam com a moral devem levar mais em conta a natureza do homem – não para agirmos conforme a natureza, mas para superá-la. Tendo consciência de que os nossos instintos nos tornam capazes de matar friamente por meio de uma alavanca ou de ignorar genocídios distantes, temos mais poder para decidir o que é ou não correto.

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